Ignorando qualquer lógica, a empresa de aeronaves não tripuladas, na prática a maior beneficiada pela Lei, foi a que mais mobilizou funcionários durante o horário de trabalho para pressionar o legislativo a acatar o veto da prefeitura ao projeto de lei que proíbe a pulverização aérea tripulada de agrotóxicos.

Funcionários uniformizados da empresa de drones fizeram uma fila e esgotaram todas senhas de acesso ao plenário da Câmara Municipal de São Carlos na sessão do dia 26/09/2023.

Na última terça, 26/09, dia de sessão ordinária na Câmara Municipal de São Carlos, a população assistiu atônita a intervenção de uma grande empresa no rumo das políticas públicas e na mobilização contra a saúde, contra a defesa da natureza e contra a agricultura familiar no município.

A maior empresa de drones da América Latina, especializada em drones agrícolas, chamada Xmobots, dispensou cerca de 250 funcionários, uniformizados, em horário de trabalho, para que chegassem à Câmara Municipal com antecedência de duas horas para ocupar o plenário, com capacidade para 70 pessoas, e impedir que outras pessoas, com posições diferentes, pudessem acompanhar a sessão em que seria discutida a manutenção ou derrubada do veto aposto pelo prefeito Airton Garcia (União Brasil) à lei do vereador Djalma Nery (PSOL) que proíbe a pulverização área de agrotóxicos com aviões em São Carlos, aprovada na Câmara por 13 votos a um no final de agosto.

Além de impedir os favoráveis à lei de acompanhar a sessão, os funcionários da empresa também impediram que fosse realizada uma manifestação pacífica por parte de membros de religiões de matriz africana que planejavam uma ação de protesto contra a intolerância religiosa e o racismo estrutural na cidade, tendo em vista recentes casos de violência e ameaça a um centro espírita local, e não puderam entrar no plenário.

Funcionários da empresa de drones em horário de serviço esgotam cadeiras no plenário e impedem acesso da população e de agricultores familiares durante sessão do dia 26/09/2023 da Câmara Municipal de São Carlos

Apesar de pareceres favoráveis da OAB São Carlos e de outros juristas atestando a constitucionalidade da lei, aprovada em primeira votação na Câmara, e de cartas de diversos grupos de pesquisa, entidades ambientalistas e artigos científicos apoiando a legislação, os vereadores mudaram sua posição e aceitaram o veto aposto pelo prefeito por 15 votos a 5.

“Foi um show de horrores: uma sessão antidemocrática, sem espaço para o contraditório, com intervenção de uma empresa que abusou do poder econômico e possivelmente constrangeu seus funcionários para que estivessem presentes assediando parlamentares e inviabilizando oposição, alegando que fechariam as portas caso a lei fosse aprovada. Até a caixa de comentários do YouTube da Câmara foi fechada! Uma vergonha completa! Iremos judicializar o processo e pedir a nulidade da sessão”, declara o vereador Djalma Nery, autor do projeto de lei.

O vereador declarou ainda que, na primeira versão do projeto, elaborado após realização de audiências públicas e diversas reuniões, foi acrescentado um dispositivo no texto para permitir justamente a utilização da pulverização de agrotóxicos com utilização de drones de até 101 kg, contemplando todos os modelos existentes no mercado hoje. A empresa, no entanto, alega que possui planos futuros a longo prazo de desenvolver modelos de drones de até uma tonelada e a mencionada lei obstaria estes planos.

O vereador declara ainda, que será lançado o movimento “São Carlos sem Veneno”, uma campanha permanente contra os agrotóxicos na cidade de São Carlos, com objetivo de mobilização, sensibilização e elaboração de novos projetos de lei ao poder público.

Link para a sessão da Câmara Municipal de São Carlos: